quarta-feira, 5 de abril de 2023

A arte no mundo pop: quando é arte e quando é entretenimento?

Eu recentemente, tive uma conversa muito desgastante, pois não quero saber dos filmes da DC e da Marvel.

O primeiro caso se deve a palhaçada feita por James Gunn com atores como Henry Cavill, Ben Affleck e outros, devido a mudança de todo os atores. Isso pode ter sido parte culpa do Dwayne Johnson, vulgo "The Rock", vulgo "ator de meio centavo"? Há essa possibilidade, mas as mudanças de elenco e produção da empresa com posse de Superman, Batman e Mulher Maravilha, já estão beirando o absurdo. Especialmente quando Cavill largou The Witcher (série de sucesso na streaming, Netflix) para reassumir seu posto como Superman. Algo que fez rapidamente em Adão Negro. 
O segundo caso se deve a dois problemas com a Casa das Ideias: eles estão fazendo TANTA coisa que depois que saiu Vingadores - Ultimato, eles priorizaram quantidade, ao invés de qualidade, algo que acontece sempre. Por isso, a Disney (detentora da Marvel e Lucas Films) diminuiu as produções de Star Wars, aumentando a qualidade dessas obras. O outro é que os efeitos especiais beiram o ridículo. Isso pode ser por pagarem as pessoas responsáveis por efeitos especiais, com um guaraná dolly e um pastel de queijo, sem o queijo.
Mas o problema nem é esse. Eu notei que ao envelhecer e notar algumas coisas, meu senso crítico se alinhava com o de Alan Moore. E como!

"Eu acredito que um artista ou escritor é o mais perto que você poderia chamar de um mago do mundo contemporâneo."
-Alan Moore
Vamos lá, primeiro devemos ter consciência de que o vem sendo produzido pelas grandes companhias não é arte. É entretenimento. 
Entretenimento é aquilo que distrai, entretém; distração, divertimento. Arte é a produção consciente de obras, formas ou objetos voltada para a concretização de um ideal de beleza e harmonia ou para a expressão da subjetividade humana como "arte literária", "arte da pintura" ou "arte cinematográfica";
habilidade ou disposição dirigida para a execução de uma finalidade prática ou teórica, realizada de forma consciente, controlada e racional; conjunto de meios e procedimentos através dos quais é possível a obtenção de finalidades práticas ou a produção de objetos; técnica.
Falado tudo isso, não podemos comparar algumas obras a outras. Pois não foram criadas para fazer refletir, mas sim para apenas entreter. Quando aquilo nos traz reflexão, ai sim posso chamar de arte. Isso na minha concepção. 
Para ser mais concreto, poderia usar obras como filmes da Disney. Tem muitos que podemos debater, como Rei Leão, Lilo & Stitch, Soul, Procurando Nemo, Zootopia, entre tantos outros. Mas vamos comparar algo mais direto: A Baleia (2023) como Doutor Estranho no Multiverso da Loucura.

“O que chamamos realidade é apenas o senso comum de nossa cultura. Ignorar outras culturas é estar cego para outras realidades.”
-Alan Moore
O primeiro é a volta de Brendan Frasser como um ator, não apenas de obras que são mais fantásticas (os filmes da saga A Múmia e a série Patrulha do Destino), mas depois de um longo tempo fora dos holofotes devido a um caso de abuso dentro de Hollywood. No filme seguimos um professor de inglês e seu relacionamento fragilizado com sua filha, Ellie. Charlie (Brendan Fraser) é um professor de inglês recluso, que vive com obesidade severa e luta contra um transtorno de compulsão alimentar. Ele dá aulas online, mas sempre deixa a webcam desligada, com medo de sua aparência. Apesar de viver sozinho, ele é cuidado pela sua amiga e enfermeira, Liz (Hong Chau). Mesmo assim, ele é sozinho, convivendo diariamente apenas com a culpa, por ter abandonado Ellie (Sadie Sink), sua filha hoje adolescente que ele deixou junto com a mãe Mary (Samantha Morton) ao se apaixonar por outro homem. Agora, ele irá buscar se reconectar com a filha adolescente e reparar seus erros do passado. Para isso, ele pede para que Ellie vá visitá-lo sem avisar sua mãe e ela aceita, com o única condição de que ele a ajuda a reescrever uma redação para a escola.
Vejam que isso aqui não foi apenas escrito. Foi elaborado de forma a tentar identificar o espectador com o protagonista. Pois Brendan Frasser, apesar de não estar tão perigosamente acima do peso, sabe como é a sensação de ser visto fora do padrão da sociedade. Isso sem contar o fator da homossexualidade, pouco tratada junto do excesso de peso. Trabalhar isso de modo a sensibilizar quem assiste, mesmo que não seja uma pessoa parecido com os personagens, demonstra a aproximação da arte. Usando sentimentos como empatia, temas polêmicos (mas não para chocar, mas sim gerar uma reflexão), isso demonstra uma elaboração bem clara de arte. Pois é isso que podemos sentir ao ler um livro, ver um quadro pintado com tintas acrílicas ou a óleo, ou até ler uma história em quadrinhos bem elaborada.

“Watchmen foi um dos livros responsáveis pela ridícula tempestade publicitária que as revistas em quadrinhos ou as graphic novels - como alguém no departamento de marketing decidiu que deveriam ser chamadas - se tornaram populares.”
-Alan Moore
Em Doutor Estranho no Multiverso da Loucura, após derrotar Dormammu e enfrentar Thanos nos eventos de Vingadores: Ultimato, o Mago Supremo, Stephen Strange (Benedict Cumberbatch), e seu parceiro Wong (Benedict Wong), continuam suas pesquisas sobre a Joia do Tempo. Mas um velho amigo que virou inimigo coloca um ponto final nos seus planos e faz com que Strange desencadeie um mal indescritível, o obrigando a enfrentar uma nova e poderosa ameaça. O longa se conecta com a série do Disney+ WandaVision e tem relação também com Loki. O longa pertence a fase 4 do MCU onde a realidade do universo pode entrar em colapso por causa do mesmo feitiço que trouxe os vilões do Teioso para o mundo dos Vingadores e o Mago Supremo precisará contar com a ajuda de Wanda (Elizabeth Olsen), que vive isolada desde os eventos de WandaVision.
Notem que isso é como uma franquia. Literalmente. Se pensarmos em franquias, nós podemos comparar com McDonald's, Burger King ou Subway da vida. Que nós dão lanches rápidos, drive-thrus até! Ou seja, algo rápido de se consumir. Que devoramos e nos dão satisfação. Uma vez, fiz uma comparação de Liga da Justiça de Zack Snyder com Stargate que faz todo o sentido aqui. Enquanto Liga era um x-tudo, o filme de viagem através de um portal estelar estaria mais para um prato bonito, como aquele que temos em um restaurante bom (não de rico, mas bom) ou o prato da mamãe. Você pode gostar do primeiro, mas o que faz bem mesmo é o segundo.
E as franquias servem apenas para isso, consumo em massa, sem a preocupação de quem irá assistir. Notem alguns detalhes sobre Multiverso da Loucura. Primeiro, seu diretor original seria Scott Derrickson (o mesmo de Exorcismo de Emily Rose) que queria um ar maior de terror no longa. Mas foi desmentindo em uma convenção, pelo homem forte da Marvel, Kevin Feige. Para não deixar de ser family friendly, assim, não diminuindo o capital final. Depois, colocaram cameos de personagens de outras franquias da Marvel, antes da compra da Fox (agora Star+). O apelo a nostalgia e o número maior de espectadores, tornam essa obra um entretenimento que um dia será esquecido.

"Ame sua raiva, não sua gaiola."
-Alan Moore
Mas por qual motivo é necessário dar mais valor a arte do que ao entretenimento? Pois a arte está compromissada a nos transmitir uma mensagem. Já o entretenimento pode transmitir uma mensagem, sem um compromisso com um cuidado e lapidação do mesmo. As vezes, nem sabe como transmitir isso. 

Alan Moore em entrevista ao Deadline disse “Não vejo filmes de super-heróis desde o primeiro Batman do Tim Burton. Eles arruinaram o cinema e até a própria cultura, de certo modo. Há muitos anos, eu disse achar preocupante que centenas de milhares de adultos fizessem fila para ver personagens que criados meio século atrás para entreter garotinhos de 12 anos. Para mim, isso vem de uma grande tentativa de fuga das complexidades do mundo moderno, de volta para (um mundo de) nostalgia, que lembra a infância. Parecia perigoso e infantiliza a população”.
“Pode ser uma grande coincidência, mas em 2016, quando o povo americano elegeu um “laranja” Nacional-Socialista e o Reino Unido votou para deixar a União Europeia, seis dos 12 filmes mais vistos foram de super-heróis. Não digo que um causou o outro, mas creio que são sintomas de um mesmo problema — uma negação crônica da realidade e uma busca tola por soluções simplistas e sensacionalistas”. E ele está certo.
Notem como um país que fez algo parecido foi o Brasil, em 2019, ao eleger Jair Messias Bolsonaro. Muitas pessoas comparavam Bolsonaro com personagens de quadrinhos. Ele com o Capitão América (já que ele também foi militar) e Sérgio Moro, juiz que julgou Lula como Superman. Noção? Nenhuma. Há uma glorificação, que faz os quadrinhos perderem sua utilidade. Pois é engraçado imaginar que Batman e Superman estão quase chegando aos 100 anos!
Não são como obras como Persépolis, também baseado em HQs, mas com uma profundidade TREMENDA. Mas tem muita gente que só aceita "vamos ver heróis estereotipados e marombados, destruir forças ancestrais ou alienígenas e falar que isso representa algo", quando na verdade isso são metas dos estúdios, que ignoram as coisas que realmente são boas.
Estou falando para pararem de ler/assistir/consumir DC e Marvel? Não. Estou falando para criarem mais critérios, como quando assisti Pantera Negra e notei o quão bom ele é. Não por ser uma parte da franquia Marvel, mas por demonstrar o quão bonita é a cultura africana e como o mundo ocidental (em especial as Américas) desmembrou ela com a colonização. Aliás, colonizador é o nome pejorativo que é dado aos brancos, o que é uma sacada de mestre. Só notam isso, quando se desligam de algo apenas como entretenimento.

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