quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

Chainsaw Man e a influência de obras na Argentina e Chile

Muita gente acha que devido ao então presidente da Argentina, ser uma figura única na mídia, ele seria uma espécie de "herói" do povo. Associando Chainsaw Man a ele devido a ser seu símbolo e parte do slogan de campanha. O que fez muita genta achar que a obra seja uma obra incel, antissemita, e anarcocapitalista (também chamado de ancap).
A primeira afirmação por parte das pessoas, é por conta do protagonista que nunca consegue consumar o seu desejo sexual. E as personagens femininas da mesma faixa de idade e ao redor dele são todas, em sua maioria, violentas e com um tom de crueldade.
Uma das acusações se deve a uma scan (tradução clandestina) que originalmente escreve uma fala do personagem Demônio do Futuro, como "o futuro é top", como "o futuro é pica". Mas parte dessas mesmas traduções faziam comentários antissemitas, o que não aparece na obra original. Demonstrando que isso pode ser uma má interpretação, ou uso indevido da história do personagem. Sem contar que há também traduções, desse mesmo scan que é misógino.
Sem contar que Chainsaw Man é considerado mangá da nova direita mundial. Trump, Bolsonaro e agora o Milei, que é parte do assunto desse texto. Ele usou a motosserra, inclusive, como um de seus símbolos de campanha. O que chamou a atenção do jovem otaku argentino, que está desiludido com a atual condição do país. E por isso, elegeu uma pessoa que fala com o cachorro e colocou a irmã em um dos ministérios, ignorando qualquer senso de noção ou responsabilidade.
O que, convenhamos, é bem diferente do personagem Denji.
Na verdade, o que podemos ver aqui é a visão de um grupo político sobre certa obra, para atender suas necessidades de eleitores. Mesmo que para isso, só tratem da mesma, de forma superficial. As vezes, até mesmo, projetar ela sem nenhum pudor.
Eu vou falar aqui sobre Chainsaw Man, mas também falarei como a ESQUERDA já fez isso uma vez: no Chile, com Dragon Ball.
Mas vejam os comparativos com Chainsaw Man: o protagonista é um humano no qual habita o Demônio da Motosserra, que nada mais seria que o medo inerente dos humanos daquele item. Tem o demônio do controle, demônio das trevas, demônio do tomate... Mas a motosserra se torna uma alusão a derrubada de árvores, para, por exemplo, criar mais campos de gado. Lembrando que um dos maiores comerciantes de carne bovina no mundo é a Argentina. O agro é pop, né?
Seu autor, Tatsuki Fujimoto, trata em suas obras questões bastante sensíveis a cultura japonesa. Sem muitos se darem conta disso. Como as relações abusivas no mercado de trabalho, os relacionamentos com as mulheres na atualidade, entre outras coisas. E a própria história é bem alternativa, pois a história é de uma terra diferente dos anos 90, pois ainda há a União Soviética. 
Ele mesmo, o protagonista, é um cara muito mal na vida. Pois ele perdeu o pai que tinha dívidas com a Yakuza, e Denji terá que pagar tudo isso! E como parte disso foi pago? Com a retirada de um olho, um rim e um dos TESTÍCULOS!!! Senhores, esse não é um herói da direita, mas nem ferrando. 
Procurem o canal o Algoritmo da Imagem, que fala sobre a Gaiola Dourada. E notem que quando uma pessoa é pobre, ao ficar rica ela faz sim um contrato de forma a lhe prender. Mas só um cara que é do proletariado perde uma parte do corpo trabalhando. Não querendo puxar o saco, mas vide Luiz Inácio "Lula" da Silva, que perdeu um dos dedos. Tu não vai ouvir falar de Elon Musk, ou Bill Gates, perdenddo o dedo em uma das empresas ao qual "criaram". Mesmo Rihanna e Beyoncé, que vieram debaixo, tem um contrato ao qual as impedia de muita coisa. Um exemplo mais recente de libertação desse tipo de controle, vindo inclusive de pais empresários, são os casos de Miley Cyrus e Britney Spears.
E Pochita é um meio de fundir os desejos de Denji, a esse ser que viria se tornar o Demônio da Motosserra.
O que nós faz pensar ainda mais com relação a como essa obra não faz alusão a anarcocapitalismo e extrema direita, está nos contratos. Com personagens como Aki, colega de Denji, entre outros, descobrimos que na verdade os demônios fazem contratos. E esses tratos, acabam com seu tempo de vida. Algo parecido, mais uma vez, com o mercado de trabalho, tornando o protagonista como um "salary man". Novamente, não sendo o único que trata de coisas assim. Zombi 100 é outro exemplo mais claro disso, e de como o Japão ainda tem que mudar muito nesse quesito de tratamento a trabalhadores.
Mas sobre a esquerda, isso também foi algo feito pela esquerda da América Latina, tempos atrás. Entendam que obras como Dragon Ball e Cavaleiros do Zodíaco influenciaram demais a infância de muitos. E a mais tempos que no Brasil, por incrível que pareça. Não estou certo, mas a obra de Akira Toriyama foi exibida completa, antes do nosso país, em territórios como o Chile e México.
Tempos atrás, circulou um vídeo de um garoto com cerca de uns cinco anos, dando ao ex-presidente Evo Moralez, um peixe. Como gesto de carinho. Isso se deve, claro, as exibições repetidas da obra em países latinos da América, mas com um que a mais. Pois isso gera na população uma certa intimidade. Você pode não se lembrar bem de uma fala em Jujustsu Kaisen ou Kimetsu no Yaiba, mas com certeza se lembra de falas em Chaves e Chapolin, assim como em Caverna do Dragão, ou até como em Todo Mundo Odeia o Chris.
Uma amiga já me disse certa vez, a repetição é a mãe da retenção. Ou seja, quando mais repetem, mais o pessoal se lembra do que foi dito na obra.
Enfim, há um artigo Instrumentalizando a Energia Coletiva: Dragon Ball Z nos Movimentos de Protesto Anti-neoliberais Chilenos, do pesquisador Camilo Diaz Pino, no volume 17, da revista Popular Communication de 2019. Nele, Camilo trata sobre as manifestações de 2011, por estudantes chilenos contras as políticas econômicas aplicadas pelo grupo neoliberal, Chicago Boys, no Chile. Isso que ocorreu durante o período da ditadura pinochetista. Um desses líderes estudantis era Gabriel Boric, atual presidente chileno. 
Houveram diversas manifestações artísticas e para chamamento (algumas mais ou menos vergonhosas, tenham isso em mente), mas a que mais chamou a atenção foi a criação de uma "genkidama real". Uma esfera gigante, que representaria o famoso golpe de Goku, em Dragon Ball (Dragon Ball Z, no anime). Que no mangá/anime, é a concentração energética de diversas pessoas pelo mundo que doam sua energia para isso.
E até mesmo os dubladores do desenho, no Chile, participaram usando suas vozes nas manifestações. Tanto em 2011, quanto em outras mais recente em 2019! Essas últimas, contrárias as políticas de austeridade do presidente Gustavo Pinera.
Tecnicamente falando, os manifestantes ouviram as vozes de Piccolo, Freeza, Gohan e Goku, reinterpretando a luta em Namekusei! Uma das partes mais queridas dos fãs, mas no cotexto chileno.
E aqui vale o aviso de Alan Moore, sobre o uso de imagens dos heróis da ficção, tais como Justiceiro, Batman, entre outros: quando Trump entrou no poder, os maiores sucessos das telas eram blockbusters de heróis, ao qual sempre associavam esses políticos a heróis. O que DISTANTE demais. Cabe a nós, mostrarmos a juventude, e a nova leva de adultos que gostar de obras de ficção é bom. Mas distinguir realidade de ficção é o mais necessário aqui.

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