terça-feira, 14 de julho de 2020

Rorschach: Por qual motivo NÃO idealizar esse personagem de Watchmen

Às vezes, para fazer as coisas direito você tem que fazer coisas erradas. Estou disposto a fazer essas coisas. Eu sempre estive disposto a fazê-las.
-Walter Kovacs
Muitas pessoas não compreendem muito da HQ de Alan Moore. Pois Rorschach é o único vigilante no começo de Watchmen ainda na ativa. Quase parecendo um protagonista dentro da obra, entretanto, isso jamais foi o tipo de escrita criada por Moore. Além disso, o autor mesmo tem consciência de quão perigoso ele é. Além de ser uma pessoa terrível.
O problema não está nem em ser um sociopata, anti-higiênico ou ser um estorvo aos poucos que o aturam (como o Coruja). Ele é um reacionário barato, que é obcecado pela visão de direita, ao ponto de consumir isso como justificativa para sua violência e modo de agir. Usando a a mesma violência extrema citada, contra criminosos. Sem contar os seus requintes de crueldade.
E isso seria mais justificado pelo seu passado quando criança. Tanto que odeia mulheres e tem uma obsessão em as chamar de “putas”. Isso seria relacionado ao passado de sua mãe, que era uma garota de programa. Além de revelar ideias homofóbicas, o que é irônico, pois a HQ deixa implícito certas tendências homossexuais de Walter Kovacs (identidade real de Rorschach. Mas é tão “travado” em seu modo de vida, que não conseguiria se aceitar assim.
O Alan Moore realmente não quer que você simpatize com ele. Mas se não quer que você simpatize com ele, o que ele queria?
Bem, temos que ver que ele realmente é um sociopata (ou seja, o meio modificou ele) pois vivia desde criança em um bairro violento, com uma mãe garota de programa que o espancava, criando em sua mente um ressentimento com relação a qualquer sexualidade e ato sexual. Além de um caso real do assassinato de uma jovem, brutalmente assassinada, que Rorschach presenciou (fato real utilizado nas HQs que não aparece no filme)... Além de todo um bairro! Isso fez com que quisesse agir como um vigilante. Pois nenhuma testemunha chamou a polícia. Ainda assim, isso não deve se tornar justificativa, visto que se fosse assim, uma pessoa com problemas na vida teria "passagem livre para a violência".
Por último temos, o assassinato da criança Blair, ao qual seu assassino a jogou aos cães, tirando o pouco de humanidade que ele ainda tinha em sua alma. O tornando mais um vigilante violento e desequilibrado, e menos um detetive. Mostrando a tradição de Watchmen de desconstruir QUALQUER arquétipo.
Pois podemos nos lembrar que os personagens de Watchmen são inspirados nos personagens da Charlton Comics. Ao qual a DC tinha comprado os direitos. E particularmente, o Questão, foi a inspiração para o Rorschach. Que foi uma criação de Steve Ditko.
Ditko era um defensor ferrenho do objetivismo. Uma filosofia desenvolvida pela escritora russo-americana, Ayn Rand, em que o puro interesse próprio é positivo e o altruísmo é negativo. Um princípio pelo qual todos deveriam viver sua vida, segundo ela. Era chamado de egoísmo ético. O que incluía nesse pensamento, que a sociedade não deveria ter nada de previdência ou bem estar social. O trabalho dela, hoje em dia é tratado com uma piada nos meios acadêmicos. Ainda assim, existe um game que faz alusão a isso mostrando como uma sociedade com o interesse próprio acima de tudo estaria condenando ela a ruína: BioShock.
Ainda assim, algumas pessoas de direita sempre citam suas obras e filosofia como Donald Trump, corporativistas, comentaristas racistas contra muçulmanos e indígenas, entre outros.
Ditko, enquanto vivo, em 66, depois de largar a Marvel, deixou mais clara suas influências do objetivismo. Quando criou o Mr. A, um vigilante que usa uma máscara sem expressão e uma roupa toda branca. Extremamente maniqueísta, que quer eliminar o mal. Simples assim. Depois teria criado o Questão para a Charlton Comics. Ou seja, Rorschach é um análogo não só do Questão, mas do Mr. A e do próprio Ditko. E como esses ideais eram cheios de falhas morais em uma sociedade atual, pois beiravam o extremismo ideológico. Uma sátira a tudo que existe nisso.
Mas o importante é que, quando uma obra é vista você pode ter sua interpretação sobre isso. Ok. Mas quando ignora a mensagem dela, isso causa uma falha terrível. É como quando uma pessoa, que se dizia entendida na área da arte falou que La Guernica (que trata dos terrores proporcionados pela guerra, em especial, bombardeamento da cidade Guernica no dia 26 de abril de 1937) ela tinha relação com sexo. Por conta da vida de Pablo Picasso.
Entretanto, não é só isso, muitas pessoas usaram máscaras de Guy Fawkes em manifestações políticas, sem saber sua origem. Lembrando que Fawkes tentou fazer a Revolução da Pólvora que tinha a finalidade de destruir o parlamento inglês no discurso, do até então, Rei James I. Mas foi preso sozinho, torturado, morto e depois esquartejado. Ainda assim, enquanto estava vivo, ele não entregou seus amigos que estavam sendo perseguidos por serem católicos ou contra a coroa inglesa. Muitas vezes, desvirtuando seu significado.
Personagens como o Batman e o Coringa se tornaram tão populares, a um ponto de setores da sociedade desvirtuar eles completamente. Seja no seu sentido antigo, como no atual. Há pessoas que acreditam que o Batman mata dentro de grupos policiais e o Coringa é associado a grupos de traficantes. Nenhum deles teria essa associação, tanto por Bob Kane e Bill Finger, como pelos responsáveis atuais da DC (como Geoff Jonhs) a esses ideais. Ainda assim, esse tipo de desinformação descaracteriza críticas, como a de que Alan Moore, tanto ao mundo de HQs (que eu posso colocar aqui também) quando as pessoas por de trás delas.

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